Continuação do post anterior...
Encostado no parapeito da janela da varanda da frente, enquanto mergulhava no seu interior, fez aquela espécie de oração, indagando Deus. A memória fê-lo viajar nas asas do tempo.
O Poeta, indicou-lhe os momentos vividos, lá no fundo da memória, no longínquo ano de 1970.
*** *** ***
Cármen tinha oito anos. Continuava a ser aquela menina doce, linda, admirada por todas as colegas da classe, e elogiada pela professora no desempenho escolar. Era a mais interessada na aprendizagem da matéria e, em cada trabalho de grupo, via a oportunidade de fazer novas amizades. Vivia na freguesia da Amadora, ainda Concelho de Oeiras, na periferia de Lisboa, no tempo em que as crianças brincavam na rua, nos jardins e nas praças em perfeita segurança.
A "Princesa", - como era tratada carinhosamente pelo seu pai -,era também, uma excelente estudante de musica. Com apenas oito anos, já tinha o privilégio de pertencer ao TopTen Children, da Academy Music Group. Foi distinguida com o prémio da melhor executante, como pianista revelação desse ano.
O destino das duas famílias estava ligado por um cordão umbilical misterioso, secreto, quase místico. Jorge desconhecia o paradeiro da Carmen. A "princesa", guardava a imagem do amigo de mil aventuras na Floresta dos Cucos, onde o sonho não morre e a aventura acontece.
*** *** ***
Jorge, com a mesma idade, já demonstrava ter aptidão para as belas artes; bastava olhar os seus desenhos a três dimensões, nas paredes brancas de cal, do muro da horta de legumes. A mãe, não aprovava a tela preferida do seu "traquinas" e reprovava a escolha, com uma palmada no fundilho das calças do filho. Mas, logo que estava com o Manuel, com seu sorriso envaidecido chamava a atenção ao escultor mor da casa:
- Marido, já viste o jeitinho que o nosso Jorge tem pró desenho?- quando dizia isso, as covinhas no rosto eram mais evidentes. O Marido abraçando-a respondia:
-Qual é a tua admiração? - Quem sai aos seus não degenera - era a gargalhada a duas vozes.
Nessa altura da conversa o filho chegava e, com aquele ar sofrido dizia:
- Pois...já sei que estão a rir de mim... - os progenitores não aguentavam a pressão, e riam, riam até a nuca lhe doer, sinal indicador que era melhor pararem, não morressem de tanto rir...
Continua...